Hoje é Dia Mundial de Combate ao Câncer. Nessa publicação, o nosso foco será o câncer de mama, um dos tipos de câncer estudados em nosso laboratório
O câncer de mama é o câncer mais frequente no mundo e o de maior incidência entre as mulheres, sem contar os casos de câncer de pele não melanoma. Em 2020 foram estimados 2,3 milhões de casos novos no mundo representando 11,7% de todos os casos de câncer, ultrapassando o câncer de pulmão.
No Brasil, de acordo com o Instituto Nacional de Câncer, são esperados mais de 66.000 casos novos de câncer de mama para cada ano do triênio 2020-2022. Isso destaca a necessidade de estratégias eficazes de rastreamento e prevenção para que exista redução significativa desses números.
Quando falamos sobre a realização da mamografia como exame preventivo para o câncer de mama, na verdade estamos falando de uma prevenção secundária, ou seja, detectar o câncer num estágio pré-clínico, sem apresentação de sinais ou sintomas, na sua fase precoce, onde ele ainda não apresenta a capacidade de invadir os tecidos. Nesses casos encontramos taxas de cura maiores que 90%. Com a difusão do rastreamento mamográfico, a partir dos anos de 1990, o número de mortes decorrentes do câncer de mama reduziu em cerca de 30%, devido à detecção precoce do tumor.
Mas será que seria possível não passarmos nem por essa fase inicial? Será que não é possível adotarmos medidas para que a doença não inicie o seu desenvolvimento?
Claro que sim! Essas são as medidas de prevenção primária, ou seja, ações voltadas para evitar a exposição aos fatores de riscos para o desenvolvimento da doença. No caso do câncer de mama podemos dividir os fatores de riscos em: fatores modificáveis e fatores de riscos não modificáveis.
Apesar de não estar totalmente compreendida, a carcinogênese pode ser dividida em 3 fases: iniciação, promoção e progressão. No caso do câncer de mama, o estrogênio teria uma ação importante na fase de promoção, expandindo os clones celulares com genoma alterado.
Grande parte dos fatores de riscos para o câncer de mama estariam relacionados a maior exposição ao estrogênio, tanto nos fatores de riscos não modificáveis quanto nos fatores modificáveis. A prevenção primária do câncer de mama age nesta cascata, retirando ou diminuindo a presença do estrogênio na fase da promoção, interferindo no processo da carcinogênese.
Os fatores não modificáveis são aqueles inerentes ao paciente e que não podem ser alterados por vias conhecidas. São exemplos de fatores de risco não modificáveis, o sexo feminino, idade após os 50 anos e presença de mutações genéticas que podem apresentar um aumento importante no risco de desenvolver a neoplasia da mama.
Já entre os fatores de riscos que podemos realizar intervenção e controlar, os fatores modificáveis, vamos encontrar a obesidade, sedentarismo, uso de bebida alcoólica e a terapia de reposição hormonal.
O sobrepeso ou obesidade está associado ao aumento do risco de câncer de mama, especialmente em mulheres que chegaram à menopausa. Isso se deve à gordura corporal, em vez dos ovários, tornar-se a principal fonte de estrogênio na menopausa. Estudos epidemiológicos indicam que mulheres na pós-menopausa com um índice de massa corpórea elevado têm um risco aumentado de câncer de mama entre 10-60%.
Em relação ao sedentarismo, sabe-se que a prática de exercício físico além de promover a manutenção ou redução do peso, levaria a diminuição dos níveis dos hormônios sexuais em mulheres na pós-menopausa. Níveis aumentados de atividade física têm sido associados a um risco reduzido de câncer de mama.
Numa análise em que 44 estudos foram avaliados, 32 observaram redução em mulheres que praticavam atividade física regularmente, resultando numa redução no risco de desenvolvimento do câncer de mama, em média entre 30 a 40% quando comparadas as mulheres que não praticavam atividade física regular.
Já o álcool parece estar associado com o aumento da concentração sérica de estrógeno através do aumento da atividade da aromatase, enzima responsável pela conversão periférica de androgênios em estrógenos, além de ocasionar o aumento da secreção de andrógenos pela adrenal e a redução do metabolismo hepático.
Estudos confirmaram que ele aumenta o risco de câncer de mama em cerca de 7%-10% para cada 10g (aproximadamente uma dose) de álcool consumido por dia. Assim, apontam também não existir uma dose segura de consumo, no entanto o efeito cumulativo pela ingesta de álcool durante a vida é o hábito de maior relevância para desenvolver a doença.
O uso de terapia hormonal com estrógeno e progesterona, altera a morfologia da mama devido ao aumento da replicação celular, gerando um tecido mais denso e complexo. Essa expansão do número de células pode ser responsável pela carcinogênese mamária associada ao uso de terapia hormonal combinada.
Vale lembrar que, apesar de a medicina não ter comprovado que alimentos gordurosos ou altamente calóricos causem câncer de mama, a dieta saudável sempre deve ser estimulada, afinal, as doenças metabólicas e cardíacas ainda são a principal causa de mortalidade entre as mulheres.
Sabe-se que não seria um fator específico capaz de desencadear a carcinogênese, mas sim uma combinação desses agentes, portanto é importante sua identificação e entendimento como parte fundamental de gênese desta doença.
"É importante notar que a presença de um ou mais fatores de risco não significa que uma mulher vai desenvolver a doença. Por outro lado, também não existe uma garantia de que mulheres sem fatores de riscos não possam apresentar câncer de mama no futuro. A explicação disso é que ainda não conhecemos tão bem a existência de outros fatores (ambientais e genéticos), que, em conjunto, possam levar ao desenvolvimento do câncer de mama."
Apesar de existirem muitas dúvidas, a compreensão de seus fatores de risco torna possível o estabelecimento de estratégias eficientes de combate e prevenção, melhorando assim o cenário tanto na incidência quanto no prognóstico da doença.
Autor: Talita Siemann Santos Pereira
Edição: Selene Elifio Esposito e Daniel J. Scheliga
Fontes:
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